Problemas para dormir? Estudo relaciona a qualidade do sono com condições crônicas
A qualidade do sono é um importante indicador do bem-estar físico, emocional e fisiológico, e um novo estudo publicado na Nature Medicine mostrou que fatores como a qualidade, regularidade e a consistência do sono estão diretamente ligadas ao risco de doenças crônicas.
É o maior estudo já feito sobre o assunto e foi conduzido por pesquisadores do Vanderbilt University Medical Center, do Programa de Pesquisa “All of Us” do National Institutes of Health (HIH) e do Google. Os pesquisadores analisaram quase 6,5 milhões de noites de sono de mais de 6.700 usuários do Fitbit durante uma média de 4,5 anos.
Entenda, a seguir, mais detalhes sobre a realização do estudo e a relação do sono com o desenvolvimento de doenças crônicas, como obesidade, hipertensão, depressão e ansiedade.
Como o estudo foi feito?
A pesquisa, publicada pela Nature Medicine, utilizou dados do All of Us Research Program, uma iniciativa dos Institutos Nacionais de Saúde dos Estados Unidos para coletar informações de saúde de mais de um milhão de participantes.
Um diferencial importante deste estudo foi a utilização de dispositivos vestíveis comerciais, como Fitbits, que possibilitaram o monitoramento preciso e contínuo dos padrões de sono dos participantes por anos. O Fitbit, em especial, usa um algoritmo proprietário que considera a frequência cardíaca e o movimento para estimar os estágios do sono. Os dados foram cruzados com registros eletrônicos de saúde (EHRs), permitindo análises robustas e longitudinais.
A amostra do estudo incluiu 6.785 adultos com uma média de idade de 50 anos, dos quais 71% eram mulheres e 84% se identificaram como brancos. Os dispositivos monitoraram padrões como duração do sono, irregularidade, fases do sono (REM, leve e profundo) — além de períodos de sono inquieto.
A coleta de dados durou, em média, 4,5 anos, fornecendo uma visão detalhada e prolongada da relação entre o sono e o desenvolvimento de doenças crônicas.
Qualidade do sono e doenças crônicas: qual a relação?
O sono não afeta apenas a disposição diária ou o humor, mas desempenha um papel fundamental na nossa saúde e bem-estar a longo prazo.
Um dos principais achados do estudo foi que a irregularidade do sono – definida como a variação no horário de dormir e na duração do sono de um dia para o outro – está diretamente relacionada ao risco aumentado de doenças como obesidade, hipertensão, ansiedade e depressão.
O sono REM (última fase do sono, em que ocorre o movimento rápido dos olhos) e o sono profundo, por exemplo, mostraram ter efeitos opostos no desenvolvimento de fibrilação atrial, uma doença cardíaca que pode levar a complicações graves, como AVC.
Pessoas que passaram mais tempo nessas fases do sono tinham menor probabilidade de desenvolver a condição. Por outro lado, um aumento na irregularidade do sono foi associado a um maior risco de obesidade, hipercolesterolemia (colesterol alto) e hipertensão.
Os pesquisadores também observaram ainda uma relação em forma de “J” entre a duração do sono e o desenvolvimento de condições como hipertensão e distúrbios de humor. Em um gráfico, o risco começa alto para quem dorme menos de 6 horas por noite, diminui para quem dorme entre 7 e 8 horas (que seria a quantidade recomendada), e depois volta a aumentar para quem dorme mais de 9 horas.
Impacto no sistema cardiovascular
As doenças cardiovasculares, como hipertensão e fibrilação atrial, foram algumas das condições mais associadas à má qualidade do sono.
Isso acontece porque a falta de sono adequado, especialmente a redução do sono profundo e do sono REM, tem um impacto direto sobre o sistema nervoso autônomo, que controla o ritmo cardíaco e a pressão arterial. A regulação inadequada desses fatores durante o sono pode aumentar o risco de desenvolver essas condições.
Outro aspecto importante é a influência da apneia do sono, um distúrbio caracterizado por interrupções repetidas da respiração durante o sono – o que pode levar a despertares súbitos frequentes. A condição foi relacionada a um risco aumentado de várias doenças crônicas, incluindo hipertensão, diabetes e doenças cardiovasculares.
O estudo confirmou que, mesmo após ajustes para apneia do sono, os padrões irregulares de sono continuaram a estar associados a um aumento significativo do risco de doenças crônicas.
A privação do sono afeta a saúde mental?
A falta de sono pode afetar diretamente a saúde mental. Quando não dormimos o suficiente, a capacidade de concentração e memória diminuem, além de causar um aumento da irritabilidade — afetando a realização das tarefas diárias.
Segundo a pesquisa, pessoas com padrões de sono irregulares ou insuficientes apresentam maior probabilidade de desenvolver depressão e transtornos de ansiedade.
Além disso, é importante entender que a relação entre o sono e a saúde mental é bidirecional. Ou seja, enquanto a privação de sono pode contribuir para o desenvolvimento de transtornos mentais, os transtornos também podem prejudicar a capacidade de ter uma noite de sono adequada.
Como manter a qualidade e regularidade do sono?
De acordo com a Associação Brasileira de Sono (ABS), cerca de 73 milhões de brasileiros sofrem de insônia. Nesse contexto, dado o impacto significativo do sono na saúde, é essencial adotar medidas para melhorar sua a qualidade e a regularidade. Confira algumas dicas:
1. Priorize o descanso
O primeiro passo para melhorar sua qualidade de sono é reconhecer a importância do descanso em sua rotina. Dormir bem ajuda você a ter mais energia, foco e bom humor no dia a dia. Por isso, tente manter horários fixos para dormir e acordar.
Às vezes, isso pode significar reorganizar sua agenda ou até cancelar alguns compromissos. Colocar o descanso como prioridade contribui para melhorar sua saúde e produtividade.
2. Crie uma rotina
Estabelecer hábitos fixos pode ser um grande aliado para alcançar um sono de qualidade. Inicie com rituais que ajudem a desacelerar a mente antes de dormir. Tente dormir sempre no mesmo horário, beber chás calmantes, tomar um banho relaxante e manter seu quarto limpo e organizado. Isso ajuda seu cérebro a entender que é hora de descansar.
3. Evite telas antes de dormir
Uma das principais dicas para melhorar a qualidade do sono é evitar o uso de dispositivos eletrônicos antes de dormir. Isso porque celulares, computadores e TVs emitem luz azul, que pode inibir a produção de melatonina, o hormônio do sono, e atrasar a chegada do sono REM. Evitar telas também ajuda a mente a relaxar mais facilmente.
4. Cuidado com a alimentação
A alimentação está relacionada a diversos processos do organismo — e não seria diferente com o sono. Bebidas estimulantes, como o café, devem ser evitando durante a noite. Além disso, alimentos como bebidas alcoólicas, açúcar, refrigerantes, embutidos, carne vermelha e refeições pesadas podem aumentar a vigilância e dificultar o sono.
Para evitar desconfortos estomacais e interrupções no seu relógio biológico, faça sua última refeição no máximo 2 horas antes de ir para a cama.
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5. Identifique possíveis distúrbios do sono
Se você tem dificuldade constante para dormir ou acorda cansado, é importante considerar a ajuda médica para identificar possíveis distúrbios do sono, como apneia, insônia, sonambulismo, bruxismo ou síndrome das pernas inquietas. Em muitos casos, a intervenção de um especialista é fundamental para ajudar a recuperar um sono de qualidade.
As dicas podem ajudar no tratamento, mas certas condições exigem acompanhamento com especialista e, em alguns casos, o uso de medicamentos. Portanto, não hesite em procurar um médico especialista em sono se necessário.
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Referências
Zheng, N.S., Annis, J., Master, H. et al. Sleep patterns and risk of chronic disease as measured by long-term monitoring with commercial wearable devices in the All of Us Research Program. Nat Med 30, 2648–2656 (2024). https://doi.org/10.1038/s41591-024-03155-8