Alimentação back to basic é o que defende a nutricionista Alê Luglio
Criada em contato com a natureza e bastante próxima aos animais, Alessanda Luglio se formou em Nutrição pela Universidade de São Paulo (USP) e, hoje, é referência no ativismo vegano. Durante a nona edição do Congresso Vegetariano Brasileiro, que aconteceu entre os dias 8 e 11 de dezembro na cidade de São Paulo, a profissional falou sobre a importância de repensar as escolhas alimentares, levando em consideração não somente interesses pessoais, mas os de outros seres e do planeta que se habita também. Acima de tudo, ela defende que a alimentação back to basic (de volta ao básico) é a solução na construção de uma sociedade saudável, equilibrada e harmônica.
“O nosso futuro como humanidade é ancestral”
Única vegetariana da turma da faculdade, Alê levou um tempo até de fato se encontrar na nutrição. Durante um período, ficou conhecida como a nutricionista das celebridades. Para conseguir uma consulta, era preciso garantir lugar na fila e ter paciência para esperar. Tudo isso porque, segundo ela, havia uma “fórmulazinha mágica” que ela aplicava com seus pacientes para que eles conseguissem emagrecer e conquistar o tão desejado corpo dos sonhos para o verão.
“Eu me senti mal fazendo as pessoas emagrecerem a qualquer custo. Isso fazia com que elas não entendessem o que estavam comendo e não tivessem a mínima conexão com a comida. Então, eu fui deixando o consultório porque eu comecei a entender que a nutrição ia muito além”, declarou.
O que é nutrir
Nesse momento, a nutricionista se reconectou com a menina que um dia foi e que brincava no campo, plantava o próprio alimento e abraçava os animais. Para ela, hoje, a nutrição tem um sentido muito mais amplo quando vista como uma proximidade com o que vem da terra. Ela reforça que entendeu que fazia parte de algo muito maior. Por isso, defende que a nutrição é muito mais do que pensar em um cardápio alimentar ou nas calorias que se ingere.
Depois de muitos estudos e de dedicação para expandir a consciência, Alê passou a investigar mais sobre os impactos da indústria alimentícia e da agropecuária em todo o ecossistema – desde questões relacionadas à saúde individual até problemas ambientais e os ataques à vida animal.
“Todo esse conhecimento me trouxe uma sensação de pertencimento ao planeta. Eu me senti parte de algo muito grande. Entendi que as minhas atitudes e as minhas ações não agem sozinhas. E as consequências delas não são só para mim”, diz.
Por que devemos repensar?
De acordo com a nutricionista, é preciso começar a relacionar as escolhas alimentares a questões maiores do que o próprio prato. Durante a palestra, ela cita itens, como: desertificação do solo, perda de biodiversidade, desmatamento e uso intensivo de agrotóxicos. Pontos que estão diretamente ligados com a forma de produzir o alimento e a maneira com a qual o consumimos.
“Nós estamos de uma forma extremamente cruel danificando as estruturas básicas que mantêm a vida na Terra para a gente comer do jeito que a gente está comendo”, opina.
Ela explica, ainda, que o sistema atual de produção de alimento é ineficiente, uma vez que ao alimentar o animal com um alimento natural, como o milho, perdem-se muitas calorias que poderiam ter sido aproveitadas para consumo humano. “De cada 9 calorias que nós plantamos de vegetais, a gente recebe 1 caloria por meio da carne. No caso do frango, 11% é convertido, enquanto 89% de toda aquela área e de todas aquelas calorias simplesmente evaporaram”, esclarece.
Além disso, a nutricionista comenta que apenas 16% das proteínas vegetais cultivadas são direcionadas para consumo humano. A maior parte é usada para alimentar os animais em criação.
“Hoje a gente planta muito mais comida para bicho do que comida para a gente.”
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Alimentação back to basic
Segundo a profissional, diante de uma realidade em que 75% das mortes do mundo são de doenças crônicas não transmissíveis, isto é, condições evitáveis relacionadas ao estilo de vida, muitas inclusive associadas ao sobrepeso e a obesidade, e em que 33 milhões de brasileiros passam fome, é urgente a necessidade de repensar a relação com a comida.
A alimentação back to basic, como defende Alê, significa um maior consumo de alimentos que vêm da terra – por exemplo vegetais, frutas, grãos, etc. Aqui, ela ressalta que o consumo de carne é uma escolha e não uma necessidade. “Tudo o que a gente precisa está no ambiente”, diz.
Ela ainda cita a importância do movimento Segunda sem Carne, uma iniciativa de conscientização que chegou ao Brasil em 2009 e incentiva as pessoas a ficarem sem produtos de origem animal durante um dia da semana. A ideia não é focar em tirar a carne do prato, mas em abrir espaço para descobrir novos sabores.
“Essa monotonia de priorizar e protagonizar pratos com alimentos de origem animal traz um problema seríssimo em toda a cadeia e para todas as pessoas. A gente vive em um país com uma diversidade de plantas absurdamente rica, mas ficamos comendo sempre a mesma coisa”, declara.
Pensar o futuro
Nesse sentido, Alê convida todos a entenderem, sobretudo, que os impactos das ações individuais são coletivos – e que, por isso, vale a pena repensar as próprias escolhas alimentares e se tornar um agente de transformação.
“A gente tem que ter a responsabilidade de libertar os outros porque não é justo usarmos a nossa liberdade para tirar a liberdade dos outros. Isso é sobre comida. Sobre entretenimento. Isso é sobre vestuário. É sobre as coisas que fazemos muitas vezes no piloto automático e que não dá mais tempo”, finaliza.
Fonte: palestra “Muito Além do Prato”, ministrada pela nutricionista Alessandra Luglio durante a nona edição do Congresso Vegetariano Brasileiro