Tratamento às pessoas com obesidade: o que falta para atendê-las bem?
Recentemente, a notícia da morte de Vitor Augusto Marcos de Oliveira, um jovem com obesidade, repercutiu na internet e nos jornais. O rapaz de 25 anos morreu no dia 5 de janeiro, dentro de uma ambulância na frente do Hospital Geral de Taipas, em São Paulo. Vitor morreu sem atendimento hospitalar, pois faltava estrutura de tratamento às pessoas com obesidade.
O caso gerou comoção com o vídeo da mãe do jovem, que fazia um apelo desesperado em frente ao hospital para salvar a vida do filho. Nas imagens, é possível notar a indiferença de pessoas e da equipe médica.
Antes de falecer, Vitor foi dispensado de seis unidades de saúde devido ao mesmo problema: falta de equipamento para acomodar pacientes com obesidade.
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O que precisa melhorar no tratamento às pessoas com obesidade?
Histórias com um desfecho como o de Victor servem de alerta para uma mudança urgente no sistema de saúde. As pessoas precisam não apenas de cuidados humanizados, mas de hospitais e clínicas prontas para acomodá-las com conforto, segurança e estrutura capaz de salvar vidas.
“Pacientes com índice de massa corporal (IMC) muito altos, acima de 40, enfrentam uma série de dificuldades seja na emergência médica, durante uma internação, na realização de exames ou mesmo durante consultas periódicas. É preciso um olhar especial para esses pacientes”, reforça Marcio Mancini, endocrinologista membro da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia Regional São Paulo (SBEM-SP)
Mancini chama atenção para as dificuldades que começam durante o transporte na ambulância. Por exemplo, uma pessoa com 250 kg precisaria, pelo menos, de 10 indivíduos para carregá-la para dentro do veículo que, em tese, deveria ter uma maca de tamanho apropriado para este perfil de paciente.
Mobilização profissional e da indústria da saúde
Contudo, além da dificuldade operacional do atendimento, é preciso examinar a pessoa que, em razão da obesidade elevada, pode ter doenças ‘escondidas’.
“Muitas vezes não se consegue sequer fazer a ausculta direito. No caso dos exames radiológicos, o raio-X convencional tem uma penetração baixa e dificuldade de visualização nessa pessoa. A mesma coisa acontece com o ultrassom ou a tomografia computadorizada: os aparelhos têm limites de peso, na maioria suportam até 200 kg. Mas existe o limite do diâmetro do pórtico da tomografia, que pode ser de 70 cm a 90 cm. Ou seja, diâmetros limitados para a pessoa com IMC muito alto entrar no aparelho”, comenta o especialista.
Mancini explica que isso também ocorre com a ressonância magnética, pois o limite de peso das mesas em geral é de até 160 kg. “Um paciente com obesidade importante pode precisar emagrecer se necessitar de uma radioterapia. Afinal, o aparelho tem limites de peso e diâmetro e aí temos de cuidar do paciente com foco na perda do peso para depois poder tratar do tumor. Isso é sério”, opina.
Condutas simples como medir a pressão, no caso destas pessoas, requer preparo, já que se faz necessário um manômetro diferenciado por causa da circunferência do braço. Uma punção venosa também é um desafio. O acesso venoso é mais complicado, sem falar nos casos de cirurgia e tempo cirúrgicos, também afetados pelo excesso de gordura.
E quando o tratamento às pessoas com obesidade envolve intubação?
As pessoas com obesidade podem ter apneia do sono e uma condição respiratória ruim. “Uma pneumonia ou embolia pulmonar, por exemplo, serão mais graves numa pessoa com obesidade. Portanto, a intubação precisa de avaliação cuidadosa. Gordura na face, no tórax, na língua, o excesso de tecidos moles no palato e na faringe e a possível limitação para flexionar a coluna cervical dificultam o procedimento”, detalha.
Ele explica ainda que, ao avaliar pessoas com IMC muito alto, é difícil predizer a capacidade funcional pela história clínica. Nesse sentido, a obesidade pode ser um limitador para o paciente fazer uma caminhada ou subir uma escada. “Ele pode ter um problema cardíaco e não saber porque ele fica muito tempo parado”, conta o médico.
O recado é: quanto maior o peso, maior a incidência de doenças que podem ficar subdiagnosticadas pela própria dificuldade na realização de exames.
“Mais comum do que a gente imagina é o paciente não ter um avental do tamanho adequado para ele vestir quando vai ser examinado, ou subir na balança que só pese até 150 kg, ou não ter um manguito de pressão para o tamanho do braço dele. São situações que geram embaraço, vergonha e constrangimento. Tal situação não pode ser negligenciado, pois é o que acaba afastando essas pessoas dos consultórios. Assim, abre-se espaço para piora da saúde delas”, finaliza Mancini.