Tempo no alvo: uma nova forma de avaliar o controle do diabetes

Saúde
23 de Agosto, 2022
Tempo no alvo: uma nova forma de avaliar o controle do diabetes

Uma das principais formas de acompanhar o controle da glicemia em quem tem diabetes é através da gotinha de sangue na ponta do dedo, como também a hemoglobina glicada que mostra a média da glicose nos últimos três meses. Mas uma nova forma de avaliar como anda a taxa de açúcar no sangue surgiu nos últimos anos: o tempo no alvo.

O tempo no alvo passou a ser minha bússola no controle, pois demonstra como as minhas escolhas e atitudes influenciam no controle glicêmico”, conta Thalynes Cardoso de Sousa, 26 anos, que convive com o diabetes tipo 1. Esse conceito propõe acompanhar, em tempo real, como o açúcar no sangue se comporta ao longo do dia: antes e depois das refeições, durante a prática de atividade física e até mesmo dormindo.

Isso porque a nossa glicemia oscila naturalmente, mesmo em quem não tem diabetes. A questão é: o quanto ela oscila e por quanto tempo ela permanece dentro ou fora dos valores ideais. Vamos entender melhor o porquê o tempo no alvo é tão importante para quem convive com o diabetes.

O que é tempo no alvo?

Antes, precisamos entender, por definição, o que é esse tal de tempo no alvo e como surgiu. A endocrinologista Denise Franco explica que o termo surgiu há poucos anos, a partir da criação dos sensores de glicemia, que permitiram monitorar 24 horas por dia a taxa de açúcar. “No final dos anos 90, a gente começa a falar sobre sensor. Até então, só tínhamos como verificar a glicemia através da ponta do dedo. Com o sensor, surge o novo conceito de tempo no alvo”, explica.

Atualmente, existem diversos sensores que monitoram a glicose, sem precisar de sangue. Alguns são utilizados por usuários de bomba de insulina, mas há o FreeStyle Libre que pode ser comprado facilmente nas farmácias. Esses dispositivos ficam acoplados na pele e não utilizam sangue, mas o líquido intersticial para checar o nível de glicose.

“Em 2019, no ATTD, congresso que discute tecnologias para diabetes, foi estabelecido um consenso e metas do que seria o tempo no alvo ideal para pacientes com diabetes”, conta Denise. E quais seriam esses valores de glicemia ideais e por quanto tempo o paciente deve mantê-los no dia a dia?

Valores ideais

Para quem tem diabetes, o ideal é que a glicemia fique entre 70 a 180 mg/dL. Esses valores podem ser ajustados de acordo com a idade, presença ou não de complicações, gestação, entre outros fatores.

“O tempo no alvo é o período que a pessoa fica dentro dessa faixa”, explica Denise. O ideal é que o paciente passe pelo menos 70% do seu tempo dentro desses valores de glicemia, o que dá em torno de mais de 16 horas ao longo do dia. Isso diminui o risco de complicações do diabetes, que podem afetar os olhos, rins, coração, entre outros órgãos.

https://www.youtube.com/watch?v=WYiqeFLt7eg

Tempo no alvo: menos variabilidade glicêmica

Além disso, é importante prestar atenção na variabilidade glicêmica, que é quando a glicemia sobe e desce de forma brusca ou fora dos valores ideais. Denise destaca que a variabilidade é tão prejudicial quanto viver com a glicemia alta. E isso, em muitos casos, só é possível de ser acompanhado pelo uso de sensores de glicose.

Por isso, além de estar, pelo menos, 70% no alvo, o paciente deve ficar atento a outros dados. “O ideal é que ele fique menos de 5% em hiperglicemia acima de 250 mg/dL, mas também menos de 4% do tempo em hipoglicemia”, faz o alerta Denise.

Ou seja, não adianta a pessoa passar 70% do tempo dentro da meta, mas os outros 30% com valores muito alterados de glicemia, pois ainda haverá o risco de complicações por excesso de variabilidade. “O tempo no alvo ajuda para ele entrar no equilíbrio, evitando os extremos que são tão prejudiciais.”

E a hemoglobina glicada?

Considerada padrão-ouro para acompanhar o controle da glicemia em quem tem diabetes, a hemoglobina glicada ainda tem sua importância e não deve ser descartada. Contudo, não deve ser a única forma de acompanhar como anda o diabetes.

“Muitas vezes a hemoglobina glicada não representa o dia a dia do paciente. Como ela mostra a média da glicemia, não dá para ver as variações que ele possa ter”, destaca a endocrinologista. De forma mais simples, o que Denise quer dizer é que, em muitos casos, os pacientes podem apresentar hipoglicemias ou hiperglicemias que são “mascaradas” na glicada, por ser uma média dos valores dos últimos meses.

Leia mais: Afinal, o que é hemoglobina glicada?

Mas e aí, como medir o controle da glicemia?

Nem tanto ao céu, nem tanto à terra. De acordo com Denise, o controle ideal da glicemia deve ser feito utilizando diferentes formas de acompanhá-la, incluindo a hemoglobina glicada, o tempo no alvo e também as medições na ponta do dedo.

Contudo, infelizmente, o uso de sensores que permite acompanhar o tempo no alvo não é acessível à maioria das pessoas por conta do elevado custo. Um dos mais conhecidos no mercado, que dura 14 dias na pele, custa em média R$280. Por isso, nesses casos, a especialista conta que a boa e velha ponta de dedo pode ajudar e muito a acompanhar o diabetes. “Quem não tem sensor pode fazer o acompanhamento pela ponta do dedo mais vezes ao dia, seguindo a orientação do seu médico, para ter mais dados sobre como está a glicemia. Isso vai ajudar a buscar o controle e evitar as variabilidades.”

Mais controle, mais liberdade

Para Renata Machado, mãe do Henrique de 8 anos que tem diabetes tipo 1, o uso do sensor e o acompanhamento do tempo no alvo trouxe mais tranquilidade na jornada. “Poder ver a reação do corpinho dele a cada refeição, além disso as variações de glicemia e os efeitos da insulina tornou nosso aprendizado muito mais fácil”, conta.

Situação parecida é vivenciada por Thalynes. Quanto mais o paciente consegue acompanhar a glicemia, mais liberdade ele sente. “O sensor de glicemia para mim passa uma sensação de autoconhecimento, pois me ajuda a perceber e investigar as causas de uma variação glicêmica de forma mais visual. Além disso, me ajuda a ter uma maior perspectiva do meu tratamento.”

Fonte: Denise Franco, endocrinologista, segunda secretária da Sociedade Brasileira de Diabetes e pesquisadora do CPCLIN/DASA.

Referência: Sociedade Brasileira de Diabetes

Sobre o autor

Beatriz Libonati
Jornalista e repórter da Vitat. Especialista em diabetes e obesidade.

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