Inteligência artificial permite detectar doença de Chagas com o celular

Saúde
31 de Maio, 2022
Inteligência artificial permite detectar doença de Chagas com o celular

Um grupo de pesquisadores publicou um estudo mostrando que é possível usar inteligência artificial para detectar a doença de Chagas. Ou mais especificamente, o Trypanosoma cruzi, protozoário causador da doença. Para isso, eles tiraram imagens de amostras de sangue com o celular e, posteriormente, analisaram o conteúdo com o apoio de um microscópio óptico. A pesquisa, que recebeu apoio da FAPESP, reuniu profissionais de várias áreas, desde biologia até matemática e computação.

“Conseguimos um bom resultado de aprendizagem da máquina. Tendo o algoritmo funcionado bem para doença de Chagas, ele poderá ser adaptado para outros propósitos que dependam de imagens. Por exemplo, análise de amostras de fezes, dermatologia e colposcopia”, diz Helder Nakaya, que é pesquisador do Hospital Israelita Albert Einstein, da Plataforma Científica Pasteur-USP, do Instituto Todos pela Saúde e do Centro de Pesquisa em Doenças Inflamatórias (CRID).

Leia mais: Doença de Chagas: conheça as causas, sintomas e tratamentos

Afinal, como detectar a doença de Chagas?

Uma forma de diagnosticar a doença de Chagas é utilizar microscopistas aptos a detectar os parasitas em amostras de sangue. Para isso, é preciso um microscópio profissional, que pode ser acoplado a uma câmera de alta resolução. Porém, por essa razão, o método pode custar caro e ser de difícil acesso para pessoas de baixa renda.

A doença de Chagas é uma das doenças tropicais negligenciadas (DTNs), de acordo com classificação da Organização Mundial da Saúde (OMS). É uma condição infecciosa crônica, cuja prevenção está ligada ao modo de transmissão, ou seja, ao controle do inseto barbeiro. Isso demanda resposta das redes de atenção à saúde.

Endêmica em 21 países das Américas, a infecção pelo Trypanosoma cruzi afeta aproximadamente 6 milhões de pessoas, com incidência anual de 30 mil casos novos na região, levando, em média, a 14 mil mortes por ano. Além disso, estima-se que cerca de 70 milhões de pessoas vivam em áreas de exposição ao barbeiro e corram o risco de contrair a doença.

No Brasil, mesmo com a tendência de queda das taxas de mortalidade, houve uma média de 4 mil óbitos a cada ano decorrentes da doença na última década.

Pesquisadores brasileiros desenvolveram um algoritmo capaz de identificar o protozoário Trypanosoma cruzi em fotos de amostras de sangue obtidas com câmeras de dispositivos móveis. Método de baixo custo foi descrito na revista PeerJ e pode ser reproduzido (imagens: acervo dos pesquisadores)

‘Ensinando’ a máquina

Os pesquisadores desenvolveram uma abordagem de aprendizado do computador baseada na chamada random forest (floresta aleatória, em tradução livre), criando um algoritmo para detecção e contagem de tripomastigotas do Trypanosoma cruzi em imagens obtidas com a câmera de telefone celular. Os tripomastigotas são a forma morfológica do protozoário presente na fase extracelular e encontrada no sangue de pacientes com a doença aguda.

A equipe analisou micrografias de amostras de esfregaço de sangue registradas em imagens com uma resolução de 12 megapixels. Foi extraído um conjunto de parâmetros morfométricos (forma e tamanho), cor e medições de textura de 1.314 parasitas.

Nessa etapa, os cientistas João Santana Silva, Paola Minoprio e Ricardo Gazzinelli, especialistas em parasitas, ajudaram a “ensinar” a máquina a reconhecê-los, especialmente o Trypanosoma. Também colaboraram os pesquisadores da USP Roberto Marcondes César Jr. e Luciano da Fontoura Costa, especialistas em aprendizado de máquina e processamento de imagem.

Depois, as amostras foram divididas em conjuntos de treino e teste, e, então, classificadas usando o algoritmo random forest. Os resultados foram valores de precisão e de sensibilidade considerados altos – ficaram em 87,6% e 90,5%, respectivamente. Assim, o grupo conseguiu automatizar a análise de imagens adquiridas com um dispositivo móvel, obtendo uma alternativa para reduzir custos e aumentar a eficiência no uso do microscópio óptico.

Próximos passos

De acordo com Nakaya, a ideia é gerar imagem e analisá-la em microscópio. Assim, será possível enviá-las mesmo de lugares remotos do Brasil para que o aplicativo informe se é ou não doença de Chagas. “Por isso é importante termos também um microscópio robusto e de baixo custo que possa automaticamente coletar as imagens”, completou.

Agora, segundo o pesquisador, a proposta é deixar o algoritmo aberto para que a comunidade científica contribua com outros dados e recursos. No entanto, inicialmente, é necessário conseguir microscópios de baixo custo.

Fonte: Agência Fapesp

Sobre o autor

Fernanda Lima
Jornalista e Subeditora da Vitat. Especialista em saúde

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