Declínio cognitivo e consumo de ultraprocessados: Entenda relação

Alimentação Bem-estar Saúde
18 de Agosto, 2022
Declínio cognitivo e consumo de ultraprocessados: Entenda relação

Pães de forma, macarrão instantâneo, refrigerantes. Os ultraprocessados são produtos que passaram por um longo processo industrial ao ponto de sua composição final não lembrar a comida de verdade. Vários estudos mostram os prejuízos que eles causam à saúde. Uma das pesquisas mais recentes, feita por cientistas da USP com base no Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (Elsa-Brasil), mostra que o consumo de ultraprocessados é um dos fatores que contribuem para o declínio do desempenho cognitivo ao longo do tempo. Assim, os resultados mostraram que a queda cognitiva ao longo da vida foi 28% maior entre os participantes que consumiram mais de 20% das calorias diárias em ultraprocessados. Isso equivale, por exemplo, a comer três pães de forma todos os dias.

Os dados estão sendo apresentados durante a Conferência Internacional da Associação de Alzheimer, que acontece ao longo desta semana, entre 31 de julho e 4 de agosto, em San Diego, nos Estados Unidos.

Declínio cognitivo e consumo de ultraprocessados: estudo

O Elsa-Brasil é um estudo epidemiológico nacional realizado desde 2008 por várias instituições como a USP, UFES, Fiocruz, UFBA, UFMG e UFRGS. Ele acompanha, sobretudo, o estado de saúde de cerca de 15 mil funcionários. A ideia é investigar a incidência e fatores de risco para doenças crônicas. Tendo como destaque as cardiovasculares (acidente vascular cerebral, hipertensão, arteriosclerose, infarto) e outras associadas. Os participantes, com idades entre 35 e 74 anos, são de várias regiões do País. No próximo mês de agosto, eles serão novamente convocados para entrevistas e exames. Assim, é possível identificar uma certa evolução dos fatores de risco para essas doenças. Afinal, elas são consideradas a principal causa de mortalidade no Brasil e no mundo.

Entre vários outros aspectos da saúde, o Elsa é, sobretudo, o estudo com a maior amostra e o maior tempo de avaliação da performance cognitiva no Brasil. Os dados das três primeiras ondas (entre 2008 e 2010, 2012 e 2014 e de 2017 a 2018) embasaram uma série de artigos. Eles encontraram associações de piora do desempenho cognitivo com diversos fatores, por exemplo, enxaquecasconsumo de álcool, inflamação e, principalmente, doenças vasculares como a hipertensão.

Fatores sociais

Além disso, fatores sociais também se mostram relevantes. Um dos artigos revelou que a adesão à dieta MIND (Mediterranean-DASH Intervention for Neurodegenerative Delay), criada para reduzir, principalmente, o risco de doenças que afetam a memória e a mente, só mostrou eficiência nesse objetivo em pacientes de alta renda, com melhores condições materiais de se alimentar de forma saudável. Em outro, os pesquisadores observaram que o estresse relacionado à rotina de trabalho também está associado ao declínio cognitivo.

Durante a conferência em San Diego, a equipe do Elsa apresenta dois novos estudos longitudinais que ainda não foram ao ar. Eles tiveram como base o acompanhamento dos participantes durante as três primeiras ondas. Assim, identificaram dois fatores que contribuem para o declínio do desempenho cognitivo ao longo do tempo. O primeiro é o consumo de ultraprocessados e o segundo o impacto do acúmulo de gordura nas artérias. 

Leia também: Agrotóxicos foram encontrados em 58% dos alimentos ultraprocessados

Consumo de ultraprocessados

O estudo sobre ultraprocessados foi realizado pela pesquisadora Natália Gonçalves em colaboração com outros integrantes do Elsa, inclusive, o grupo de pesquisa do professor Carlos Augusto Monteiro, coordenador do Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde (Nupens), da Faculdade de Saúde Pública (FSP), um dos órgãos diretamente envolvidos na elaboração do Guia Alimentar para a População Brasileira.

A pesquisa utilizou os dados de 10.775 pessoas coletados nas três primeiras ondas do Elsa para classificar a alimentação dos participantes de acordo com os quatro grupos descritos pelo Guia: não processados (vegetais, frutas, cereais etc.), ingredientes culinários (azeites, sal, óleos), alimentos processados (com modificações leves como adição de sal ou açúcar) e ultraprocessados, “alimentos que passaram por um longo processo industrial ao ponto de que a sua composição final nem lembra comida de verdade” (pães de forma, macarrão instantâneo, marmitas prontas, refrigerantes, entre outros).

Declínio cognitivo e consumo de ultraprocessados: Resultados

A partir disso, os pesquisadores dividiram as pessoas em quatro grupos. Isso foi feito de acordo com a porcentagem de ultraprocessados na dieta. Por fim, eles descobriram que as pessoas que comem mais desse tipo de produto (acima de 20% da ingestão diária) têm uma queda 28% maior na performance cognitiva do que as que comem menos (abaixo de 20%). Para tornar mais palpável o que isso significa, a pesquisadora explica que 20% de calorias diárias vindas de ultraprocessados equivalem a, por exemplo, míseras três fatias de pão de forma por dia.

“Esses resultados, além de inéditos, são muito importantes. Eles apontam para um comportamento que as pessoas podem modificar. Dessa forma, podem possivelmente diminuir a chance de declínio cognitivo ao longo dos anos”, diz Natália ao Jornal da USP.

Além dela, o artigo Higher consumption of ultra-processed foods is related to cognitive decline in the Brazilian Longitudinal Study of Adult Health (ELSA-Brasil) tem como coautores Naomi Vidal Ferreira, Claudia Kimie Suemoto e Renata Bertazzi Levy, da Faculdade de Medicina da USP; Neha Khandpur, Euridice Martinez Steele, Dirce M. Marchioni, da Faculdade de Saúde Pública da USP; Paulo Andrade Lotufo e Isabela Judith Martins Bensenor, do Hospital Universitário da USP; Paulo Caramelli, da UFMG, e Sheila Maria Alvim de Matos, da UFBA.

Veja, neste link, outras pesquisas realizadas pelo Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (Elsa-Brasil).

Mais informações: Claudia Suemoto, em cksuemoto@usp.br, Naomi Vidal Ferreira, em naomivferreira@gmail.com, e Natália Gonçalves, em natalia.g@fm.usp.br

Fonte: Jornal da USP

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