Infecção por Salmonella: estudo descobre mecanismo da bactéria
Há milhões de anos, as bactérias competem entre si para sobreviverem. Elas utilizam diferentes estratégias para tentar matar suas concorrentes e assim garantir alimento para se proliferarem. A infecção por Salmonella, bactéria da família das Enterobacteriaceae, usa toxinas com essa finalidade contra membros da microbiota intestinal.
Faltava, no entanto, descobrir quais eram essas toxinas e como elas atuam — feito que coube a pesquisadores do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (ICB-USP).
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Achados do estudo
Publicada na revista científica eLife, a descoberta abre caminho para um novo alvo de terapia contra a salmonelose. A doença atinge o aparelho gastrointestinal e é uma das principais responsáveis por infecções alimentares no mundo.
De acordo com Ethel Bayer Santos, pesquisadora da FAPESP e coordenadora do laboratório responsável pelo estudo, quatro toxinas (TseVs) inéditas foram alvo da pesquisa.
“As toxinas possuem regiões de proteínas que geralmente disponíveis em enzimas que atuam no reparo de DNA [momento no qual a célula identifica e corrige os danos das moléculas de DNA]. Contudo, em vez de reparo, as toxinas causam dano no DNA, e atacam ele no momento da sua replicação, quando são formadas estruturas em formato de Y”, explica.
Elas são disparadas pelo sistema de secreção do tipo 6, que são grandes complexos de proteínas, em formato de uma lança contrátil, que se encontram na membrana das bactérias.
A Salmonella encosta na membrana da competidora e libera as toxinas dentro dessas células, eliminando a competição e ficando livre para causar a infecção nas células do intestino do hospedeiro.
“Já sabíamos que Salmonella pode intoxicar os membros da microbiota. Mas é a primeira vez que vimos uma toxina antibacteriana que tem como alvo estruturas específicas de DNA”, explica Bayer Santos.
Causas da infecção por Salmonella
As infecções pela Salmonella ocorrem principalmente por causa de alimentos contaminados. Por exemplo, ingestão de carnes e ovos crus ou malpassados, manipulação dos alimentos sem a devida higienização ou contaminação cruzada. As infecções em humanos são causadas por sorotipos de Salmonella enterica, sendo mais comuns S. Enteritidis e S. Typhimurium.
A contaminação geralmente causa gastroenterite, doença que provoca e inflamação e irritação no sistema digestivo. Como resultado, manifesta sintomas como diarreia, dor abdominal, cólicas, náuseas e vómitos.
No entanto, novas cepas que surgiram na África mostraram-se invasivas, afetando outros órgãos e causando infecções sistêmicas, que podem ser fatais.
“Ao entender como essas toxinas afetam a microbiota, talvez possamos ter um novo medicamento probiótico para promover resistência a infecção por esses patógenos, auxiliando na prevenção e melhora dos pacientes.”
Microscopia e bioinformática
Nos estudos in vitro, os pesquisadores perceberam os ataques na dupla fita de DNA em dois ensaios de microscopia.
“Observamos as bactérias crescendo e competindo umas com as outras, depois contamos quantas sobreviveram e se era possível ter mutações de adaptação. Além disso, sintetizamos artificialmente vários fragmentos de DNA para verificar em quais estruturas aconteciam os ataques”, detalha Julia Hespanhol, mestranda em microbiologia e uma das responsáveis pela pesquisa.
Além da microscopia, os cientistas empregaram técnicas de bioinformática para encontrar outras bactérias que têm sequências de toxinas similares em seus genomas.
“Nossas descobertas podem se aplicar a outros grupos de bactérias. Por exemplo, as Pseudomonas [causadoras da fibrose cística] e outras enterobactérias [bactérias da mesma família da Salmonella]”, destaca Daniel Sanchez, doutorando em microbiologia pelo ICB que também participou do estudo.