Anticoagulante Apixaban inibe replicação do vírus da Covid-19
Publicado no Journal of Molecular Cell Biology, estudo da Fiocruz comprovou que o anticoagulante de uso oral Apixaban é eficaz para inibir a replicação do vírus Sars-CoV-2, causador da Covid-19. Este tipo de medicamento já era recomendado para prevenir níveis altos de Dímero D. Ou seja, produto final da cascata de coagulação e está relacionado diretamente à Covid-19 severa.
Os pesquisadores da Fundação descobriram, porém, que a droga também apresenta função antiviral ao inibir, de forma não competitiva, a replicação do vírus. Isso acontece devido à semelhança estrutural entre Fator X Ativado (FXa), fundamental no processo de coagulação. Além disso, a Major Protease (Mpro), uma enzima importantíssima para os coronavírus.
“O uso de anticoagulantes ajuda a prevenir a Covid severa, e tínhamos a preocupação de descobrir se havia mecanismos adicionais para esse benefício clínico. Quando você sobrepõe as imagens de FXa e Mpro, elas têm uma correlação estrutural, então nos perguntamos se os anticoagulantes poderiam também inibir a enzima viral. Esse trabalho mostra que sim e descreve como este mecanismo funciona. Assim, provando que essa atividade antiviral também pode estar contribuindo, em alguma magnitude, para o benefício clínico que esses pacientes têm”, explicou um dos autores do estudo, o pesquisador Thiago Moreno L. Souza, do Centro de Desenvolvimento Tecnológico em Saúde (CDTS/Fiocruz).
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Como o anticoagulante Apixaban funciona?
O medicamento é capaz de atrapalhar a ação da Mpro – e, consequentemente, a replicação do vírus – por meio de inibição não competitiva. Durante o processo de replicação, a Mpro precisa quebrar as proteínas não estruturais do vírus, chamadas de substrato. O Apixaban não impede a interação entre Mpro e substrato, mas diminui consideravelmente a velocidade dessas quebras, de modo que a enzima não consiga cumprir seu papel adequadamente na presença do medicamento. Em vez de impedir a ligação entre substrato e o sítio ativo da enzima, o remédio se liga a outro sítio. Esse processo é chamado de “não competitivo” porque inibidor e substrato podem estar ligados à enzima ao mesmo tempo.
“Funciona como uma poda. A protease viral tem um papel fundamental durante o ciclo de vida do vírus, porque ela corta suas proteínas não estruturais para que elas possam amadurecer. Esse amadurecimento, que acontece a partir da ação da Mpro, permite que as outras etapas da replicação do vírus ocorram. Os anticoagulantes orais não impedem que a Mpro interaja com o substrato, mas atuam numa outra região de enzima, tirando-a do seu prumo e impedindo que ela cumpra sua função. Por causa disso, dizemos que o Apixaban não compete com o substrato, mas impede que essas proteínas recebam cortes, e isso é o que dá esse amadurecimento para que elas possam funcionar”, detalhou Moreno.
Anticoagulantes avaliados
Entre os avaliados, o anticoagulante Apixaban foi o mais eficaz para inibir a atividade da Mpro. Ele se mostrou 21 vezes mais potente que o GC 376, um conhecido inibidor de Mpro, utilizado como grupo controle positivo (aquele que serve de comparação para o tratamento que está sendo testado). O outro inibidor de FXa avaliado, rivaroxaban, e o inibidor de trombina dabigatran tiveram potência semelhante à do GC 376.
Os pesquisadores recomendam que a estrutura química do Apixaban tenha avaliação de forma mais profunda. Portanto, para que se possa entender com precisão como ela se associa ao complexo formado por enzima e substrato. Desse modo, ela pode servir de ponto de partida para o desenvolvimento de inibidores não competitivos de Mpro. Assim, que preservem a atividade anticoagulante e, no futuro, de antivirais específicos contra a Covid-19.
“Anticoagulantes de uso oral são relativamente novos na clínica médica; o mais frequente era que esse tratamento fosse feito com remédios injetáveis. Os estudos contra a Covid-19 utilizaram as mais diferentes classes de anticoagulantes e, dentre os de uso oral, testamos todos. Vimos que a melhor substância era o Apixaban, o que pode motivar outros estudos. Então, seja in vivo e clínico, para avaliar se de fato ele deve ser priorizado frente a outros anticoagulantes no tratamento da Covid-19”, concluiu.
Fonte: Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).