‘Uma Garota de Muita Sorte’: os impactos do estupro no cérebro
Recentemente, a Netflix lançou o filme “Uma Garota de Muita Sorte”, que vem conquistando os espectadores cada dia mais. Isso porque rapidamente o suspense entrou para o top 10 de filmes mais vistos do streaming. O novo lançamento é baseado em fatos reais e conta a história de uma menina chamada Ani, que foi abusada sexualmente na adolescência. Durante o longa, é possível perceber que, mesmo após tantos anos, ela não consegue “superar” completamente o trauma do estupro.
Protagonizado pela atriz Milla Kunis, o filme gerou debate e dúvidas sobre as sequelas na saúde mental da mulher após um abuso sexual. Por isso, conversamos com o Pós PhD em neurociências, Dr. Fabiano de Abreu, para explicar mais os efeitos do trauma no cérebro.
Como o cérebro reage a uma situação de estupro?
De acordo com o Dr. Fabiano, o abuso sexual é um trauma que traz uma série de impactos à mente da vítima, em especial à amígdala cerebral – parte do cérebro responsável pelos instintos. Pois após o abuso, essa região é altamente afetada por uma superestimulação.
Assim, essa estimulação faz com que a amígdala crie associações entre determinadas situações e emoções traumáticas. Consequentemente, o cérebro interpreta situações inofensivas como perigosas ameaças, deixando-os em estado de alerta.
“O trauma sexual pode afetar a capacidade do cérebro de reconhecer e sentir sensações, o colocando em estado de alerta e gerando o transtorno de estresse pós-traumático”, ressalta Fabiano.
Além disso, durante a agressão sexual, o sistema nervoso simpático libera hormônios do estresse no cérebro, que gera o estado de alerta e sobrevivência, preparando-se para lutar, fugir ou ‘congelar’. Isto é, o cérebro prioriza passar pelo evento para processá-lo depois.
Quando o cérebro processa toda a situação ele passa por mudanças biológicas relacionadas ao TEPT – Transtorno de Estresse Pós-Traumático – que envolvem alterações de memórias no hipocampo, subdesenvolvimento do hemisfério esquerdo do cérebro e superativação da amígdala cerebral.
Leia também: Abuso sexual infantil: sinais que a criança pode estar sendo violentada
Os efeitos do trauma no cérebro
Ainda de acordo com o Dr. Fabiano, o abuso sexual traz alterações para o funcionamento do cérebro. “Altera o córtex somatossensorial, área do cérebro responsável por criar sensações e percepções a partir de informações do corpo, isso pode levar à diminuição da sensação do desejo sexual e até mesmo dor crônica nas áreas do corpo que foram envolvidas com o abuso.”
Assim, existem uma série de sequelas na saúde mental da vítima após o trauma da violência sexual, incluindo depressão, ansiedade, sentimentos de culpa e vergonha, tendências a vícios e dificuldades de memorização.
O especialista entrevistado afirma que em estados de alto estresse, medo ou terror, como a agressão sexual, o córtex pré-frontal é prejudicado por uma onda de substâncias químicas de estresse. Mas quando essa parte do cérebro fica “offline”, somos menos capazes de controlar intencionalmente o que prestamos atenção, de dar sentido ao que estamos experimentando e de recordar nossa experiência de maneira ordenada”.
“A vítima de um estupro morre por dentro. Não no sentido literal, mas os danos são irreversíveis”, diz o Dr. Fabiano.
Fonte: Dr. Fabiano de Abreu, pós PhD em neurociências.